quinta-feira, 7 de maio de 2009

Praia (1978)


Pairava a névoa
Sobre o mar de prata,
Ondas lânguidas o ponteavam,
Suaves e murmurantes.
Traziam o lamento dos ventos,
Seus queixumes de brisa e tempestades.

Gaivotas, quantas gaivotas
A areia doirada pisavam,
Lugubremente piando.
Um choro compassado choravam,
As cabeças levantadas, as asas abrindo
Ao sol filtrado pelo nevoeiro cinzento,
Triste, traiçoeiro.

Sentinelas mudas
Semeadas no mar
Deixavam-se bater pelas vagas,
Deixavam-se bater,
Silenciosas, sob o tecto celestial, frias...
As rochas...

Lá longe, lâmina brutal, afiada
Separava céu e água:
O horizonte.

Perto, muito perto,
Um pedaço de embarcação
Corroído pelo tempo,
Jazia esquecido no areal.
Crianças, pétalas de flor jovem,
Nele brincavam e riam,
Enlevadas e infantis,
A pele tostada pelo sol,
Belas, juvenis.

Perto, muito mais perto ainda,
Um cachorro velho
De focinho melancólico e suplicante
Olhava-me.
Nos seus olhos mortiços
Lia-se o mar, o cinzento do céu, a vida.
A sua vida?

Sorri-lhe então.
Pus no meu sorriso a ternura
Que pelos homens não sinto.
Estendi a mão
Lenta e meigamente.
Fugiu.
Lesto no seu passo,
Com as grandes orelhas baloiçando.
Não quis a minha companhia
Continuando a correr,
Deixando marcas na areia molhada,
Assustando as gaivotas,
Ás ondas ladrando...
Vi-o afastar-se, mais e mais...

Sobre mim,
O sol libertara-se da névoa,
Ria agora,
Agora que já não me apetecia sequer sorrir...

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